Literatura Fantástica nas ondas do rádio




domingo, 13 de março de 2011

Mês de São Valentim VI


O Crime de Amar

por Daniel Cavalcante


– Eu te ensinei desde seus primeiros dias, Maia. Nós não amamos – Era o que dizia Alex, o líder e juiz do nosso clã, General do Exército da Noite e, por um acaso, meu pai e mentor, aquele que me deu o dom da vida eterna.

Doutrinava-me como um padre catequizando um pagão.

– Devemos aprender a controlar essa coisa repulsiva que os humanos chamam de “amor” – dizia ele, pronunciando a ultima palavra com tom de quem tem nojo.

Caminhávamos pelos túneis úmidos e frios de nossas passagens subterrâneas, debaixo da cidade, onde ele aprisionava os párias de nosso clã. Tais calabouços eram conectados ao sistema de esgotos, onde era sabido que os lupinos, em suas primeiras transformações, costumavam se refugiar dos olhares humanos, se alimentando de ratos e tudo o mais que encontrassem. Era nossa pior sentença de morte, uma grande humilhação um vampiro ser condenado à morte nas garras de nossos inimigos.

– É por causa desse vírus chamado amor – continuou Alex – que recebemos de outros clãs relatos sobre vampiros que sentem pena dos humanos. Alguns dizem até que se apaixonam! – Riu com sarcasmo e prosseguiu – Imagine se apaixonar pela comida... Sei que às vezes temos inclinação à volúpia típica dos humanos. É a sede de sangue, ela faz isso conosco. Acabamos por buscar por outros prazeres, saciar outros desejos. Admito que é um instinto natural e humanos nunca passarão de um pedaço de carne para nos alimentar e satisfazer. O que não posso admitir é essa história absurda de amor entre vampiros, que andam comentando por aí!

Estávamos entre câmaras onde grades e tijolos encarceravam outros vampiros que haviam cometido aquele que Alex considerava o pior crime. Estranhamente, a maioria eram mulheres. Será que somos tão suscetíveis assim a esse vírus? Alex continuava falando sem parar:

– Estamos em guerra, minha criança. Somos o clã mais temido pelos lupinos e temos o mais disposto exército porque não temos apego a nada além da sobrevivência. Mas quando ISTO acontece – ressaltou raivoso, apontando para os condenados por amar – enfraquecemos. Estes, que dizem amar, entregariam nossos segredos ao inimigo caso seus pares fossem capturados. O tal amor é um apego perigoso.

Enquanto andávamos, eu observava o cárcere. Nas paredes de tijolo de cada jaula havia muito sangue seco e, no chão, restos de ossos, vestígios dos condenados. O cheiro pestilento de carne apodrecida e dejetos de ratos me dava náuseas. No olhar perdido dos prisioneiros que aguardavam a morte eminente, o conformismo. Alex caminhava austero, orgulhoso do cumprimento de sua própria lei.

– Você sempre soube disso, Maia, e mesmo assim escolheu se entregar a tal desgraça. Não me resta escolha.

Então, Alex me trancafiou no cárcere.

– Mas você teve escolha quando me entreguei a você – respondi – Escolheu me amar durante aquela noite.

– Disso ninguém vai saber, Maia.

– Você pode me deixar aqui para morrer, Alex, seu hipócrita, mas terá que conviver pela eternidade com o fato de que eu o amo e que a culpa é sua.

– Ah, a ilusão. Não se preocupe, Maia – disse meu adorado mentor, olhando para as vampiras aprisionadas, que o fitavam apaixonadas e entristecidas – Como pode ver ao seu redor, estou acostumado a conviver com isso.

Alex se afastou deixando-me para a morte com suas outras filhas-amantes. Mas o que me intriga desde aquele dia é a visita do mentor ao cárcere. Fica ali entre os túneis, afastado, observando cada um de nós, inexpressivo. Ontem tive a impressão de ter visto o reflexo de uma lágrima em seus olhos. Mas pode ser uma outra ilusão minha, como a de que ele um dia me amou.

Anoitece. A lua cheia começa a subir no céu. Alex não apareceu nos túneis dessa vez. Ouço uivos agonizantes de lupinos em sua primeira transformação...

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Daniel Cavalcante é editor da Editora Infinitum, responsável pela revista Quadrinize! e também escrever "Colégio Marista - Crônicas Sobrenaturais".

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Um comentário:

  1. Saudações!!

    Venho presenteá-lo com o selo "STYLISH BLOOGER AWARD".

    Espero que goste e passe adiante o selo, seguindo as regras que está em minha postagem.

    Parabéns pelo seu blog!!

    http://criaturasdaescuridao.blogspot.com/2011/03/blog-criaturas-da-escuridao-ganha-selo.html

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